VIDA QUOTIDIANA DAS MONJAS NO MOSTEIRO MEDIEVAL - CAPº III A RAINHA, O PAPA E O BISPO

>> quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

A rainha D. Teresa, recém-nomeada padroeira do mosteiro de Lorvão, como boa e prudente administradora que era, deu um Seguro ao do seu mosteiro. Dirigiu-se ao Papa, pedindo a Sua Santidade que confirmasse ao mosteiro os seus bens. Honório III acedeu ao pedido.

Na respetiva bula papal eram citadas todas as propriedades que haviam sido indicadas pela Rainha, e, para o caso de alguma ter sido esquecida, a bula garantia às monjas de Lorvão todos os outros seus bens e suas heranças, a saber: ‘prados e vinhas, terras, bosques e prados em monte e vale, e águas e caminhos e passagens’ e ainda, especificamente, ‘todas as outras liberdades e isenções devidas às mesmas propriedades’. D. Teresa iria pedir e, e obter mais ainda. A filiação do mosteiro de Santa Maria de Lorvão a Cister garantia ao mosteiro os privilégios de que a Ordem gozava em Portugal, e, em I223, D. Teresa obtinha do Papa uma Bula dispensando Lorvão de pagar a dízima à Igreja. Ou seja, não tinha de pagar à Igreja a décima parte dos produtos das suas propriedades, tanto daquelas que já cultivava, como daquelas que futuramente viesse a cultivar. Livres também de dízimas as suas hortas, os seus pomares, os seus pesqueiros, o gado que criasse. Se algum bispo, presente ou futuro, exigisse a dízima e ameaçasse as monjas ou seus criados e servidores com excomunhão ou com interdito por não a pagarem, tal sentença ou interdição seria nula. E mais. Se algum servidor ou amigo do mosteiro quisesse trabalhar para Lorvão em dia que fosse santificado na sua diocese, não seria por isso castigado. De momento que o dia não fosse santificado para a Ordem de Cister, bem entendido. A dízima, a décima parte dos frutos, ou ‘décima de Deus’, era recebida pelos bispos da respectiva diocese. A terça parte da dízima pertencia ao bispo, outra parte ao clero, enquanto a outra parte se destinava- à manutenção do culto, das igrejas, dos livros, das vestes, dos vasos litúrgicos da diocese. Com essa dispensa aproveitavam ainda os rendeiros do mosteiro, também eles não pagando dízima. Quando os mordomos do mosteiro iam avaliar a colheita dos caseiros para dela tirarem a oitava, ou a sexta ou a quinta parte que cabia ao mosteiro, a avaliação que faziam era a partir duma colheita mais avultada, já que não se lhe retirara a ‘décima de Deus’. Dado que a diocese onde as monjas tinham mais propriedades era a de Coimbra, o prelado mais afetado pelos privilégios que o Papa tão generosamente concedia a Lorvão era o bispo de Coimbra. O mesmo bispo que expulsara de Lorvão os monges negros a favor da rainha D. Teresa. Aquele D. Pedro Soeiro, que se convencera que a Rainha agiria sempre sob a sua autoridade e seguiria os seus conselhos, perdia toda e qualquer autoridade sobre Lorvão, e via-se obrigado a tratar as monjas com cuidados e atenções que nunca precisara de usar para com os monges. As restrições impostas ao bispo de Coimbra e aos outros bispos das dioceses onde Lorvão tinha propriedades, não se ficavam aliás pelas referidas medidas. De ali em diante, esses senhores não poderiam obrigar as pessoas que dependiam do mosteiro a responder ‘sobre suas rendas e bens nos sínodos e ajuntamentos públicos ou juizes seculares’. Os achincalhados prelados também não poderiam ir ao mosteiro celebrar ordens, ou tratar de dívidas, ou fazer lá, por qualquer outra razão, ajuntamento público. Já isso cortava, e de que maneira, nos rendimentos das sedes episcopais. E mais ainda se lhes cortava, não permitindo que os bispos recebessem remuneração por serviços que prestassem ao mosteiro de Lorvão: nem por consagração de igreja, nem por benção de altar ou de vaso sagrado, nem pela celebração de qualquer sacramento, antes ‘todas essas coisas faça graciosamente o bispo diocesano’. Convenha-se que era duro. Por fim, para arredondar as coisas, o Papa ainda confirmava ao mosteiro todas as liberdades e isenções, que ele próprio, ou algum dos seus antecessores alguma vez tivessem concedido à Ordem de Cister à qual o mosteiro pertencia. Os Bispos recalcitravam, exigiam que lhes fosse enviada prova de que Lorvão tinha este ou aquele privilégio, Dona Abadessa tinha dez dias para lhe enviar a carta de privilégios em que se baseava para levar as dízimas. De contrário seria severamente castigada. O que Lorvão poupava com a magnânima Bula refletia-se materialmente nos mais variados campos, com teremos ocasião de verificar.

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