Desculpas ao Professor

>> segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Cabe-me pedir desculpa ao Professor M. Rebelo de Sousa. O título da Exposição que presentemente está no MNAA é “Os Primitivos. No século de Nuno Gonçalves.”
A desinformação é do Museu, o Professor não fez mais que a repetir.
Afinal não foi o Professor que meteu Nuno Gonçalves no tempo dos Primitivos, ou os Primitivos no tempo do Nuno Gonçalves. A coisa não é clara. Seja como for, deve ter feito José de Figueiredo dar uma volta no túmulo. Criar um grande pintor renascentista, e vê-lo agora metido nos Primitivos.
Esta exposição é, creio eu, a contribuição para uma grande homenagem e defesa a Nuno Gonçalves.
Não se percebe bem porque é que Nuno Gonçalves tem de ser periodicamente defendido. Que eu saiba, há em Portugal uma única pessoa que não acredita no N. G. autor dos painéis. É verdade que sou teimosa e persisto na minha convicção. E até o escrevo quando vem a propósito.
Mas quem acredita em mim? Ninguém. Mas incomodo o MNAA. Uma ou outra cabeça pensante daquela augusta instituição leu a argumentação com a qual José de Figueiredo estabeleceu o pintor de retábulos à moda italiana como autor do retrato de sessenta pessoas à moda flamenga. Algum dos nossos historiadores de Arte leu atentamente e aceita esse raciocínio de José de Figueiredo que faria reprovar um aluno do Secundário? Não importa. Há que defender Nuno Gonçalves.

Não era isto que eu queria escrever neste fim de ano. Mas tinha de pedir desculpa ao Professor.

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Os Primitivos

>> segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Sou aluna atenta das aulas do professor Marcelo Rebelo de Sousa na TVI. Como todo o aluno gosto de apanhar o meu professor em falta. Numa das suas últimas aulas, o Professor anunciou que estava agora no MNAA uma Exposição de Primitivos Portugueses, e como supôs, e decerto com razão, que ninguém sabe o que são os Primitivos, elucidou,”no tempo de Nuno Gonçalves”.
Bem sei que Nuno Gonçalves é suposto ter pintado praticamente ao mesmo tempo um retábulo à maneira italiana e umas tábuas à maneira flamenga, e isso nos anos setenta do século XV. Se isso é no tempo dos Primitivos?
Dito por outra pessoa não tinha graça nenhuma, o que faz o caso engraçado é o professor nos querer elucidar e acabar por nos elucidar com um erro.


Creio que toda a gente tem na mente e na memória a lembrança de frases absurdas, afirmações com graça, palavras destorcidas, que uma vez ouviu, e que ficam ligadas à pessoa de quem as ouviu. É o nosso anedotário particular.
Recordo:
Luisa P.
Vai com a mãe a Paris, onde se instalam num modesto hotel. A mãe compra umas panelas que ainda não há cá. A dona do hotel repara e comenta: - Não há panelas em Portugal? Luisa, patriota, reponde: - Há. E muito boas.
Do José A:
No seu último exame a uma pergunta do profesor, José responde: palavrra que sei, mas não lembrro.
Do José M.
Escreve a uma rapariga, declarando o seu amor.
Julga ser correpondido: - enganarei-me.
Resposta pela volta do correio:
-enganarou-se.

O Professor enganarou-se.

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“Digamos”

>> segunda-feira, 22 de novembro de 2010

“Digamos”
A crise económica deu novas vedetas à TV: os economistas. E com eles uma agradável novidade, ouve-se um bom português. Esses senhores sabem o que uma vírgula em sítio errado pode produzir, têm tanto cuidado com as palavras como com os números. É um prazer ouvi-los e um agradável contraste com as outras vedetas. Auditora atenta notei que na sua fala raras vezes se ouviam “digamos”, “na medida de” e o “significativamente” caros aos políticos e seus comentadores. Há dias um Secretário de Estado usou em pouco espaço de tempo por seis vezes a expressão “digamos”.
Nada já é “assim ou assado”, é, “digamos assim ou assado”. E tudo o que se faz, ou que sucede, é feito ou sucede “na mediada que”. E nada é simplesmente grande ou pequeno, ou um pouco maior ou um pouco mais pequeno. Agora é”significativamente” maior ou mais pequeno, ou melhor, ou pior.
Também notei que os economistas, honra lhes seja, usam o verbo “estar” na sua inteireza. Não se lhes ouve o “tá bem” e “tamos bem”, que hoje se ouve da boca de políticos do governo e fora dele.

Antes de haver TV falava-se provavelmente igualmente mal. Mas não se ouvia. Agora ouve-se. O problema é esse.

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Editoras

>> segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O primeiro livro de ficção que apresentei – timidamente – a uma editora foi “ As Casas da Celeste”. Disseram-me muito simpaticamente, que, caso se tratasse de um livro inglês – ou outra língua que não o português – que o podiam publicar, mas assim, não.
Um amigo que acreditava no livro decidiu mostrá-lo a outra editora.
- Não o podemos publicar. Bem vê – O meu amigo viu.
No livro um camarada, do qual se troça ligeiramente. Pouquíssimo, comparado com outras figuras, mas o bastante para incomodar o “partido”.
O livro foi depois publicado e não incomodou ninguém. As razões das editoras para aceitar ou rejeitar um livro nem sempre são compreendidas pelos autores. Experimentei-o recentemente, de novo. Perguntei à minha editora se estava interessada num livro sobre a sociedade aristocrata portuguesa no séc. XIX, baseado na correspondência de uma senhora dessa sociedade e suas filhas. De 1834 a 1911.
- Muito interessadas, mas queriam ver primeiro um apanhado. Achei justíssimo. Mandei logo um apanhado.
Resposta – Que lamentavam, mas que não interessava porque” não tinha pessoas conhecidas”. Considerando que aquelas senhoras eram mulheres cultas, que liam os jornais de toda as cores, que se interessavam vivamente por política, que por laços familiares estavam ligadas a muitas das figuras políticas da sua sociedade, que conheciam pessoalmente e contactavam com as figuras régias , e que sobre elas escreviam, e as comentavam, e que no índice onomástico se nomeiam 390 nomes de políticos de esquerda e direita, de rainhas e reis, de várias nacionalidades, de pintores e escritores, não sei que nomes conhecidos do séc. XIX, possam faltar. A editora lá saberá.

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Também isto é Europa

>> segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Estávamos sentadas à mesa da cozinha a cortar peras para compota.
Ela é russa, e vem de vez em quando substituir uma amiga ucraniana, que trabalha para mim -
Foi casada com um búlgaro, e agora namora um português. Eu sou filha de uma portuguesa e um alemão, o meu marido era português e a minha filha é casada com um italiano.
Falámos de instrução. - A minha mãe foi ensinada pela minha avó – disse ela.
-Porquê? - perguntei,
-Sabe o que é Gulag ?
-Sei, tive lá um primo - respondi.
- Nos da Sibéria?
- Sim - respondi.
-Um português, perguntou ela, espantada.
-Não. Um alemão
-Ah, E voltou?
-Depois de dez anos apareceu.
-O meu avô não voltou - disse ela - Era professor. A minha avó esperou, esperou, mas ele não voltou. Como ela tinha o marido no Gulag, a filha não podia ir à escola e foi a minha avó que a ensinou. Foi uma grande mulher, a minha avó.
Tive um irmão na frente leste. Tive primos do lado alemão que lá ficaram. Mas aquele que esteve no Gulag, não era meu parente pelo lado paterno. Descendia de uma prima da minha avó que casara com um alemão-nunca esqueceu a sua longínqua ascendência portuguesa.
Entre milhões de outros houve também um prisioneiro de sangue português em um dos campos do Gulag.
Também isto é Europa

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Artigos de jornal. Curtos, por favor.

>> quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Quando constatei que o catálogo da Exposição das tapeçarias de Pastrana, publicado pelo MNAA era uma mina de desinformação escrevi um artigo que enviei ao jornal Expresso com pedido de publicação.
Sempre critiquei artigos de jornal demasiado longos e fiz aquilo que sempre criticara. Tempos depois recebo um mail do jornal. Que abreviasse aquilo para 35000 caracteres se queria ter uma possibilidade de publicação.
Pareceu-me impossível, mas tentei. Enviei uma primeira versão de 35000 mil e alguns caracteres.
Novo mail. Ainda era grande demais. Tinha de contar caracteres e espaços. Emagreci o pobre artigo para os requeridos caracteres.
Foi aceite. E sabem uma coisa? O artigo ficou muito melhor. Aprendi. Nunca se é demasiado velho para aprender.

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Tapeçarias de Pastrana 4

>> segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Mandante, mandatário, ou quê?
Em artigo que escrevi sobre o catálogo da Exposição das Tapeçarias de Pastrana, escrevi que para poder estudar as tapeçarias, era importante conhecer quem fora o seu “mandatário”, ou seja, quem fora o homem que ideara a obra, que escolhera artista, que a executaria, que lhe dera instruções sobre o que desejava ver representado, e de que forma. Designei esse homem por “mandatário”, e sei hoje que a palavra mandatário tem outro sentido, que é errada no contexto em que a empreguei. Preciso da palavra certa. Se é que existe. Agradeço sugestões.

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Tapeçarias de Pastrana 3

>> terça-feira, 17 de agosto de 2010

Durante anos devo ter sido a única pessoa em Portugal a ter no seu computador uma pasta dedicada às tapeçarias que hoje se admiram no MNAA. Agora os interessados são muitos e alguns de renome, mas o meu interesse não diminuiu. Creio já ter escrito, que, em matéria de textos, o catálogo da Exposição pouco satisfaz a quem da investigação histórica exige um pouco mais do que afirmações sem provas, e textos floreados que não querem dizer nada. O catálogo, excelente na sua parte gráfica, é, na parte escrita, de uma superficialidade verdadeiramente indigna de um grande Museu. Se já o disse e o repito, é porque deve ser dito e redito. Não se trata aliás só de ‘superficialidade’, que essa não pretende enganar. É únicamente resultado de mandrieira.
Tive ocasião de falar em pessoa com o director dos estudos da fundação Calos de Amberes, que há dias esteve em Portugal. Foi uma conversa esclarecedora. De uma coisa fiquei certa, é que por maior que seja o estudo que a Fundação vai dedicar, e já está dedicando, ao estudo de todos os aspectos das Tapeçarias, que muito ainda pode ser procurado e examinado da parte de Portugal. Não lhe escondi, e ele aceitou, rindo, que iria fazer pesquisas concorrentes com as do Instituto. Ele já sabia a minha opinião sobre quem tenha sido o mais provável mandatário daquela grande obra, e creio que não vai deixar de a examinar. Lembrei-lhe a esse propósito, que :
No caso de se concluir – ou de se partir, tentativamente do princípio - que o mandatário das Tapeçarias foi o então duque de Guimarães e futuro 3º duque de Bragança, então as Tapeçarias devem ser “lidas’ segundo o relato dos acontecimentos de autor favorável ao duque. Sucede que o autor transcrito no catálogo não menciona a pessoa de um homem que teve parte tão activa nos acontecimentos como foi o caso de D. Fernando. Espantou-me essa omissão, até que verifiquei que os extractos citados eram da autoria de Damião de Góis, o qual, segundo D. António Caetano de Sousa, era pouco favorável ao duque.
Repito, se o Duque foi o mandatário das Tapeçarias, ele daria as suas instruções ao autor dos cartões sobre os quais se iria edificar a obra, e nessas instruções estaria naturalmente o seu ponto de vista dos acontecimentos que as tapeçarias deviam fixar.
Formei um grupo de trabalho para o estudo português das Tapeçarias. Por enquanto tem na minha modesta pessoa, coadjuvado por uma auxiliar, o seu único membro. É pouco. Talvez que das brumas da blogolândia surjam outros interessados em heráldica, nas armas, nas missões que queiram fazer parte deste grupo de trabalho.

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Tapeçarias de Pastrana 2

>> quarta-feira, 4 de agosto de 2010

“Inicia-se agora - fora de Portugal, note-se - o estudo aprofundado das Tapeçarias de Pastrana, consideradas uma obra prima no seu género. Para o efeito vão ser consultados os melhores especialistas em todos os campos. A Fundação Carlos Amberes, que vai custear essa investigação, espera decerto que Portugal contribuirá para essa investigação. Exigindo naturalmente dados devidamente fundados. Muito particularmente sobre as possíveis origens das tapeçarias, já que é dessa informação que se podem tirar outras conclusões. Se o ponto de partida é errado, as deduções certas não são possíveis. O Museu presta um mau serviço à investigação, quando sem provas, sem sequer averiguar se elas existem, dá como certo que D. Afonso V foi o dono e mandatário das Tapeçarias, Na ausência de provas, as dúvidas são permitidas e, sendo assim, eu diria:
1º A única tapeçaria cuja posse tem sido atribuída a D. Afonso V é a da ‘Justiça do Imperador Trajano’
2º D. Afonso V não era homem para se auto-elogiar
3º D. Afonso V não se podia permitir o luxo de uma tão grande despesa
4º Em Portugal só havia um homem que tivesse fortuna para pagar as somas fabulosas que tapeçarias daquela qualidade forçosamente custariam, era D. Fernando, 3º Duque de Bragança
5º Se foi D. Afonso V quem ideou as campanhas do norte de África, quem as pôs em marcha foi o Duque de Bragança. As tapeçarias honram o rei e honram a ele, duque
6º No testamento que o duque redige nas vésperas da batalha de Toro, distingue entre os seus bens moveis em particular as suas tapeçarias, aquelas que levava consigo, as que tinha em Arevalos, e as que estavam em Guimarães. A estas lega a sua mulher.
Em resumo, é a partir da pessoa do 3º duque de Bragança que se deve investigar, não a partir de D. Afonso V.”
Foi esta a carta que enviei a alguns jornais. Não sei se foi publicada, não sei se haverá quem me ache demasiado severa. Afinal todos erramos. Assim é, mas no caso em discussão não se trata de erro, de uma data por ventura trocada, trata-se de o Museu deliberadamente enganar o leitor do seu catálogo. O catálogo de uma grande exposição deve ser uma obra de referência, e este, que o Museu nos vende, e por bom preço, é uma obra de desinformação. A atribuição das tapeçarias a D. Afonso V sem disso ter prova, é uma falta de respeito pelo nosso espírito crítico. Mas há mais. Os senhores do Museu não estudaram a questão, afirmaram sem saber. Mas há pior. Há afirmações francamente falsas, que enganam propositadamente para apoiar uma tese. Não quero entrar nesse campo. Mas não fui demasiado severa. A uma instituição cultural temos o direito de exigir rigor e seriedade intelectual, e o Museu Nacional de Arte Antiga não pode fugir a essas obrigações.

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Tapeçarias de Pastrana

>> terça-feira, 27 de julho de 2010

De vez em quando escrevo uma carta para o jornal. Deixo-a ficar de molho durante uma noite, no dia seguinte, releio, não envio. Também sucede mandar e o jornal não publicar. Desta vez vou mandar para mais que um jornal e estou curiosa de ver, se algum publica. Trata de tema cultural, coisa que em geral não interessa, e, dentro desta de um pequeno facto que ainda menos deve interessar. Eu explico. No catálogo da Exposição das tapeçarias de Pastrana o Museu faz uma afirmação acerca das origens das Tapeçarias, que a ser verdade é uma informação histórica importante. Essa informação não é documentada. O que em História não é admissível. Em nenhuma circunstância. Neste caso a omissão é particularmente grave, porque em Espanha se está a proceder a uma investigação de todo o historial das Tapeçarias, e para isso é essencial que os dados sejam devidamente documentados. Se o ponto de partida não for correcto, as deduções correctas não são possíveis. Foi isso que apontei na minha ‘carta ao director’ de vários jornais. Estou curiosa de ver se algum deles me publica.

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José Saramago

>> terça-feira, 29 de junho de 2010

Morreu José Saramago. Oiço dizer “ah, mas recebeu o Nobel”. “Recebeu o Nobel, e quem recebe o Nobel é o melhor do mundo”. “Por ele a língua portuguesa chegou a todo o mundo”, “até o Bispo tal já diz que foi uma figura impar da cultura portuguesa”. Ainda não ouvi ninguém dizer: “Que bem que ele escrevia”, “O que eu gostei do livro de Saramago”. “Que prosa a de Saramago”. “Escrevia maravilhosamente bem”. Também é curioso que não haja críticos literários que analisem a sua obra, pelo seu valor literário, esquecendo o Nobel. E alguém que explique a razão de uma escrita sem pontuação e nos explique a nós, simples mortais, o porquê dessa forma.

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“Pensalhar”

>> terça-feira, 22 de junho de 2010

Foi Mia Couto quem criou a palavra. Diz ele que, pare ele, a melhor forma de passar uma viagem de avião, é a pensar. E a esse pensar chama ele ‘pensalhar’. Há pouco publicou um livro com alguns desses pensamentos, dessas pensalheiras. Estou profundamente agradecida a Mia Couto por esta sua criação. Adopto-a com entusiasmo. O meu computador não conhece a palavra, protesta. Não faço caso. Há muito que eu procuro a palavra que exprimisse uma das formas daquilo que eu gosto de fazer: pensar. Distinguindo porém entre diferentes formas de pensar. A uma delas, vaga, solta, saltitante, sem objectivo, era-me até agora difícil de definir. Foi-me perguntado mais do que uma vez, o que estava eu para ali a fazer, quieta, calada, olhando em frente. Não me sentia bem? Tentava explicar que estava bem, que estava só a pensar. Apressava-me a acrescentar, que não era em coisa profunda, era só a pensar. Ainda não tinha a palavra certa. Agora já posso responder: “estou a pensalhar”. Pensalhar pode ser assim: “Que azul tão escuro tem hoje o mar. Até mete medo. Um dia vem por aí a dentro e engole-nos. Se calhar vai ser pelo mar que o mundo um dia será tragado. Não o mundo. A terra. E a lua? Também desaparece? Ou será ela que nos faz desaparecer? Quando será a lua cheia? Há pessoas, que se sentem deprimidas em dias de lua cheia. Disparate. Ou talvez não. Depressão não é brincadeira. Dizem.” E por aí fora, mais ou menos assim.
Eu gosto de pensalhar. Gosto de estar calada, quieta, alinhando em mente impressões, ideias, palavras. Agora sei o que isso é. É uma pensalheira. Obrigada, Mia Couto.

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O homem de letras

>> segunda-feira, 14 de junho de 2010

Há agora na vida pública uma figura literária profissional, à qual eu, até há pouco, não sabia dar nome. Agora sei. É um “homem de letras”. É a tradução literal do francês “homme de lettres”. Não sei se em França a definição ainda se usa, em português parece-me que não se usa e nunca usou. Eu é que apliquei a expressão espontaneamente a alguém que ouvi numa entrevista, e decidi falar disso aqui.
O homem de letras é um especialista em matéria de letras. Não é o engenheiro, que concebe e constrói os motores, é o homem que sabe qual ele é, e como ele é, e aonde ele se fabrica. Conhece tudo em matéria de motores, mas não é o peso pesado da engenharia. O homem de letras não é o peso pesado da literatura. Não é o engenheiro. É o técnico. Conhece os livros e os seus autores, critica e analisa livros, por vezes publica as suas críticas em livro, mas não é um escritor. Conhece os editores, e vai ao lançamento de livros que eles publicam. Fala fluentemente sobre qualquer desses aspectos da vida literária, feiras de livros, leilões de livros de qualidade, poetas que são políticos e vice versa, etc. No grande público, é tido por intelectual.
Nos fins do século XIX, o homem de letras surge nos romances franceses como elo de ligação entre as grandes senhoras com aspirações literárias e o mundo dos livros. O “homme de lettres" não era ele próprio aquilo que se entendia por escritor. O escritor labutava no seu triste sótão, e – com raras excepções – não tinha ambições mundanas. O homem de letras substituía-o com vantagem. Vestia bem, tinha boas maneiras, Dava à reunião mundana um agradável, ligeiro, toque de intelectualidade, e como em geral tinha espírito, divertia. Era o conviva ideal.
Já não há salões, nem grandes senhoras cultivando homens de letras. A definição desapareceu, e, no entanto, acabando de ouvir uma entrevista na TV, eu disse para comigo: “É boa. Este homem – ou seja o entrevistado – é aquilo a que no passado se entendia por homem de letras”. E o que é que eu vira e ouvira?
Vira um homem novo, nem bonito nem feio. Gordote. Tinha as mãos em cima da mesa. De onde não se ergueram. Nem para um gesto que fosse. Só os beiços se moviam, quando, num evidente esforço, respondia ao seu entrevistador. O qual, jovem, e talvez pouco experiente, parecendo transido de respeito e admiração, fazia perguntas anódinas, às quais Pedro Mexia - era ele o convidado - respondia a dormir.
Pedro Mexia confessou que, sim, que era um pouco misantropo. Desabusado da humanidade, da qual já nada de bom se pode esperar. Ficámos também a saber que Pedro Mexia acaba de traduzir uma peça inglesa, com muito humor inglês, que o autor da peça permitiu que ele tomasse algumas liberdades na tradução, para adaptar o texto aos conhecimentos do espectador português. Assim, por exemplo, substituiu “cricket” por “tennis”. Pedro Mexia não aprecia o Papa, escreveu até um artigo de severa crítica quando da sua eleição. Apreciou no entanto ter sido convidado para a reunião da elite cultural com Bento XVI. O qual, não sendo comparável ao seu antecessor, tem algum peso intelectual. Pedro Mexia foi autor de um blogue, que tivera um grande “feed-back” – o entrevistador mostrou a sua respeitosa admiração – e publicara o conteúdo do blogue em livro. Acha que os livros devem ser escritos por escritores, e não por inspiração de um qualquer, e é severo quanto ao mau português que se escreve. Faz lançamentos de livros, tem um programa na rádio. E, “although last, not least”, Pedro Mexia é benfiquista. No grande dia do título, foi para o marquês de Pombal vestido a rigor clubista de boné e cascol e outros atavios. Nem um sorriso, nem um gesto acompanharam essa declaração. Restou-nos a nós, ouvintes, imaginar a contribuição daquela esfíngica figura festejando os heróis encarnados.
Subtraindo o amor clubista, e algumas diferenças condicionadas pelo tempo, creio que não foi asneira minha, quando, em mente, apelidei Pedro Mexia de “homme de lettres” do século XXI.

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A ‘velha’na literatura

>> terça-feira, 1 de junho de 2010

Toca o telefone. Desejam que me pronuncie sobre determinado produto. Respondo que já ultrapassei a idade de dar opiniões. “E não há aí alguém de 68 anos?” perguntam-me. “Não tenho a certeza, mas vou ver”. Desliguei, rindo. Pergunto-me se terei falado com um idiota ou com alguém com graça, com sentido de humor. Espero que fosse o último.
Gostaria de saber em que dados se terão baseado as agências de publicidade para concluírem que, passados os 68 anos, os velhos não têm capacidade de opiniar sobre papel higiénico ou detergente?
A história fala dos conselhos dos velhos, cuja opinião era a ultima palavra. Nos mosteiros femininos medievais, a abadessa convocava o conselho das anciãs quando havia assunto difícil a resolver.
Na literatura, que afinal procura recriar a realidade, a mulher velha pode ser má, mas raras vezes é estúpida. O tipo da ‘velha’ é aliás um dos tipos da literatura. Ou seja, literariamente, a mulher velha interessa. Ela encontra-se em contos e romances. E quase sempre como figura activa. Nos contos, é mais vezes bruxa má do que bondosa avó. Inclinada, apoiada no seu pau, arguta, capaz de prever o futuro, de adivinhar intenções. Assustadora. Foi assim que os contistas do passado viram a mulher velha.
Quando os irmãos Grimm percorreram a Alemanha à procura de velhos contos, era de preferência a mulheres idosas que se dirigiam. Sabiam que elas recordavam. Que tinham em alto grau essa faculdade.
A literatura, grande e pequena, tem construído histórias sobre a mulher velha que recorda.
Muito recentemente ouvi o Dr. Henrique Monteiro, director do Expresso, ser entrevistado sobre um seu romance, creio que o primeiro, intitulado ‘Toda uma vida’, no qual o autor faz reviver a história do século passado através da vida e das recordações de uma mulher velha.
Eu fiz o mesmo, e também no meu primeiro romance, se bem que o segundo a ser editado. Servi-me da figura de uma velha senhora para reconstruir o passado. O passado de uma família.
Já não era uma jovem quando escrevi ‘ A Morte de uma senhora’. Henrique Monteiro não é um jovem. Penso que a mulher velha não é personagem para autores jovens.
Creio que é preciso uma certa maturidade para poder – e querer – criar uma obra sobre a pessoa de uma mulher velha. Ou mesmo para a incluir entre as figuras secundárias dos seus livros.
Mas não faltou quem delas tratasse. Quem as achasse ‘interessantes’. Recordo, nos livros alemães do romantismo as avós bondosas e acolhedoras, não me esqueço da avelha camponesa russa que esperava a passagem dos comboios que levavam os prisioneiros para a Sibéria, para os confortar com a sua bênção. Das velhas francesas lembro-me de camponesas, duras, rancorosas, implacáveis.
O romance policial não se esqueceu delas. Surgem em muitas das investigações do inspector Maigret. Vê-mo-lo mais de uma vez confrontado com a astúcia e a força de uma velha mulher.
Astúcia e força são também as faculdades que Agatha Christie atribuie à sua Miss Marple. Velha, frágil, mas forte. E que recorda. Que resolve os problemas com o uso da sua memória e conhecimento dos homens.
A longevidade da mulher distingue-a do homem. Este desaparece, ela vai ficando. Velha, frágil, mas forte. Teimando em viver, reconfortante e incómoda, como aquela velha Bibiana do ‘Tempo e o Vento’ baloiçando-se na sua cadeira, observando os novos repetir as asneiras dos seus predecessores.

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O cabeçalho

>> segunda-feira, 24 de maio de 2010

O meu computador é ‘topo da gama’. Dizem. Eu não precisava de tanto, mas para o meu caso tinha de ser aquele e não outro. Aceitei o super computador. Carregam-se em duas teclas, e o que era pequeno, passa a ser grande, enorme. É especial para mim, e estou grata a quem o ideou. Penso que foi ‘alguém’, espero que tenha havido ali a mão humana, mas em computadores nunca se sabe. Eles já fazem tudo por si. É normal. Dizem. É normal, que nas Amazon dos diferentes países se lembrem de mim, me escrevam a lembrar a sua existência e me saúdem com simpatia quando volto a aparecer. É normal em computador, não precisa de ninguém para o fazer. E pois normal que ele me proponha livros que estão dentro dos meus hábitos de leitura. Cheguei a Imaginar que uma bibliotecária escolhia para mim os meus livros. Sentia-me lisonjeada pela atenção. Sei já que não é bem assim, que não há ali a mão humana, que é o computador. É normal. Assim como é normal que ele me emende os erros de ortografia. Não porém a pontuação. Não gosta da pontuação. O escritor que se arranje.
O meu computador faz tudo o que fazem os seus colegas e um pouco mais. Tive ocasião de constatar que o meu computador lê os meus pensamentos, que me ajuda espontaneamente em casos de dúvida.
Preparava-me para escrever à minha filha. Escrevi ‘sexta-feira’, e pensei para comigo “dia 19 ou dia 20?” O meu computador sentiu a minha dúvida, e, solícito, escreveu:20 . Era o dia 20.
Aceitei, mas um pouco irritada. Como sabia ele que eu quisera saber o dia do mês? Talvez tivesse querido escrever o dia do Santo, sexta-feira, dia de São João, por exemplo. Mas eu queria de facto a data, e o computador sabia-o. Tudo quanto há de mais normal.
Tive ontem nova prova de solicitude informática.
Estou a preparar para publicação uma série de cartas do século XIX. Vão de 1834 a 1910., e são sobretudo cartas de mulheres. Cartas compiladas e copiadas por mim. Da minha bisavó materna e suas filhas. Mulheres instruídas, cultas, falam dos acontecimentos mundanos, sociais e políticos do dia, discutem-nos. Pareceu-me por isso adequado iniciar as cartas de cada novo ano, com um pequeno resumo dos acontecimentos mais importantes desse ano, com um cabeçalho. Assim, por exemplo:
1853
Em Portugal: Morte de D. Maria II. Regência de D. Fernando II na minoridade de D. Pedro V. Primeiros trabalhos de assentamentos dos caminhos de ferro. Utilização de selos postais.
Sucede que, ao rever agora esse aspecto do – futuro e ainda hipotético - livro, constatei que para o ano de 1869 não havia esse resumo. Virei-me para o lado, e anotei: “1869, falta cabeçalho”. Olho de novo para o ecran, e o que vejo? A observação: “falta o cabeçalho”. Acho demais!

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Um bom romance

>> terça-feira, 18 de maio de 2010

Num destes sábados ‘à hora nobre’ ouvi no segundo canal, as últimas frases de uma conversa da locutora com José Rodrigues dos Santos. Pareceu-me que o assunto fora uma série de dez entrevistas que José Rodrigues dos Santos vai fazer, ou já fez a dez romancistas. A entrevistadora pediu no fim ao seu convidado, que lhe dissesse como definia um ‘bom romance’. José Rodrigues dos Santos respondeu sem hesitar: “um bom romance é uma boa história, bem contada”.
Que simples. Que fácil. Que bom deve ser, pode responder com tanta confiança, tanta firmeza, a tão difícil pergunta.
A definição não é errada, é até óbvia, mas o que nos diz ela? Suponhamos que alguém, talvez a minha filha, me perguntava, como muitas vezes o fez, que tal era o livro – romance – que eu estava lendo.
“Lê-se muito bem, uma óptima história”, responderia, ou talvez: “Gosto. A história é Interessante, e está muito bem contada.” A interlocutora perceberia, que eu estava lendo um ‘bom romance’. Um dos milhares de livros que anualmente são editados, que nos contam bem – com habilidade - uma boa história.
Fosse a resposta à mesma pergunta um pouco diferente, se respondesse, por exemplo: “Um grande livro”, ou “este sim, este vai ficar”, então a minha filha perceberia que, em minha opinião, havia naquele livro qualquer coisa, que fazia dele mais que uma boa leitura, mais do que ‘um bom romance’.
Alguém pode falar de “O Tempo e o Vento” de E. Veríssimo como um bom romance? Ou de “O Pavilhão dos Cancerosos’ de Soljenytsine? Ou de ‘O Primeiro Círculo’ do mesmo autor?
São todos eles boas histórias, bem contadas. Mas não são aquilo que correntemente entendemos por bons romances. O que são é grandes livros.
O que distingue uns dos outros? Dois livros podem ter o mesmo tema, os seus autores podem, um e outro, tratar o tema com grande habilidade, dando-nos uma história bem contada, pode suceder que um dos livros seja só um ‘bom romance’ e o outro seja um ‘grande livro’. Dois exemplos:
‘Kim’ de Kipling e ‘The Far Pavillions’ de T. F. Kaye. O tema é o mesmo, o rapaz inglês que nasce na Índia, e que, por acidente, vive desde criança como hindu e se considera tal, só muito tarde vindo a saber que é inglês. Os dados são os mesmos. ‘The Far Pavillions’, é empolgante. Enorme, lê-se de um fôlego. ‘Kim’ também é empolgante. Mas lê-se mais lentamente. Também queremos saber o que se vai passar na página seguinte, mas temos de saborear página por página. ‘Kim’ é um grande livro.’ The Far Pavillions’ é só um óptimo romance.
Consideremos duas obras mais recentes: ‘O primeiro Círculo ‘ de Soljenytsine e ‘Doutor Jivago’ de Pasternak. O último é um grande romance, o ‘Primeiro Círculo’ é um grande livro.
Quem os lê, sente que são diferentes. Que um deles nos dá mais do que o prazer de uma boa leitura. Porque nos faz sentir e pensar. E admirar.
Observação à margem
O verbo ‘estar’ conjuga-se agora da seguinte forma:
Eu tou
Tu tas
Ele tá
Nós tamos
Vós tais
Eles tão. Não esquecer

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Recordar poemas

>> terça-feira, 11 de maio de 2010

Nos meus tempos de escolaridade, aprendiam-se versos. Aprendi versos em alemão e português, em francês, em inglês. E tínhamos de os recitar. Em festa escolar, era sabido, fazia parte do programa que um aluno recitasse uma poesia. Não nos fez mal.
Sei as primeiras linhas de inúmeras poesias, e muitas sei por inteiro. Gosto de as relembrar e recitar para mim, e agora mais do que nunca, que não as posso ler.
E o gosto não é só de agora. Em viagens de automóvel, ao volant5, sempre recitei para mim. Em voz alta. Poesias fáceis, que não me distraíssem. Confesso que tenho pena das crianças a quem não ensinam versos. Não sabem o que perdem. Porque os versos que se aprendem em criança nunca mais se esquecem por completo. Alguma coisa deles fica, nem que seja só uma estrofe, ou só duas ou três linhas. Um dia vêm-nos à memória, e é uma alegria.
Quando há não muito tempo uma leitura me fez recordar a peça ‘Wallenstein’ de Schiller, veio-me de imediato, sem pensar, a lembrança dos versos que toda a nossa classe, rapazes e raparigas, recitava com entusiasmo, sem sermos obrigados. Para nós, porque gostávamos do ritmo empolgante daqueles versos: “Vamos, camaradas, a cavalo, a cavalo” “Wohlauf, Kameraden. Aufs Pferd, aufs Pferd, ins Feld, in die Freiheit geritten”. E por aí fora.
Há poesias para todas as emoções, todas as impressões, todas as ocasiões. Há poesias alegres e poesias tristes, românticas e realistas, profundas e ligeiras, é só escolher. E lembrar.
A propósito da muito falada crise, lembrei-me da fábula de La Fontaine sobre a cigarra e a formiga. Aprendi-a nas aulas de francês. Em Portugal já não se aprende francês, La Fontaine deve ser pouco conhecido. Não importa. Tenho vontade de recordar ‘La Cigale et la Fourmi’, Acho que vem a propósito a história da cigarra que cantou durante todo o verão sem pensar em juntar qualquer coisa para o inverno. E a laboriosa formiga, que se nega a lhe emprestar, aconselhando-a a dançar, já que passou o verão a cantar. Aqui vai, portanto:
“La clgale, ayant chanté tout l’été,
Se trouva fort dépourvue
Quand la bise fut venue.
Elle alla crier famine
Chez la fourmi, sa voisine,
La priant, de lui prêter
Quelques grains pour subsister
Jusqu’á la saison nouvelle.
La fourmi n’est point préteuse,
C’est lá son moindre défaut.
Que faisiez vous au temps chaud?
Demanda-t-elle à la quéteuse.
Au temps chaud?
Je chantait, ne vous déplaise.
Vous chantiez? J’en suis fort aise.
Et bien, dansez maintenant.

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Biografia ou romance histórico?

>> terça-feira, 4 de maio de 2010

Aos sábados, das 10 da manhã ao meio-dia, há na Antena 1, um programa intitulado ‘Hotel Babilónia’. Nos meus tempos de leitora, não o ouvia, agora, que sou sobretudo auditora, oiço o ’Hotel Babilónia’. Na sua segunda parte, quando os anfitriões, João Goberne e Luís Delgado, conversam com uma convidada. Neste sábado, a conversa foi com Isabel Stilwell, e sobre livros seus. Três livros sobre três rainhas: D.Filipa de Lancastre, D. Catarina de Bragança e D.Amélia de Orléans. Isabel Stilwell narra as suas vidas sob a forma de romance histórico. Uma opção perfeitamente aceitável.
Ora sucede, que em todos os três livros se vê na capa o nome da respectiva rainha e o seu retrato. Vendo isso, o leitor, que pega no livro, pensa naturalmente que se trata da biografia daquela personagem. Foi o meu caso, quando há tempos peguei numa livraria no ‘D.Catarina de Bragança’ da autora. Com curiosidade e simpatia, já que o meu primeiro livro fora a biografia do marquês de Sande, o homem que negociara o casamento daquela infanta portuguesa com Carlos II de Inglaterra, e que depois conduzira a futura rainha, e lhe aturara os maus humores. Abri portanto o livro de Isabel Stilwell, curiosa de ver como ela pegara naquela pouco simpática figura. Abri o livro ao acaso para ter uma ideia. E li, com algum espanto, confesso, como D.Catarina, falando a seu marido, lhe dirige estas palavras: “não me diga, Carlos”. Para já não falar no pouco provável uso de uma expressão que tem muito poucos anos, por alguém do século XVII, era impossível em biografia, onde o discurso directo não existe, a não ser numa citação. Era forçoso concluir que aquele livro, intitulado ‘D.Catarina de Bragança’ e com o retrato da rainha na capa, não era afinal o que parecia ser. Não era uma biografia daquela rainha. Pois não, disseram-me, era um romance histórico.
Agora saiu o ‘D. Amélia de Orléans’, que é, da mesma autora, que, tal como os dois livros precedentes, é um romance histórico. Que tal como estes, aparenta ser - pela capa e título - uma biografia.
Tratando-se de um romance histórioco, ou seja de um romance, no qual aquela senhora é evocada de forma lúdica, então isso devia ser percebido. Por exemplo, dando-lhe um título deste tipo: ‘Uma Orléans?’ Já que aquela rainha de Portugal ainda sofria do estigma de ser uma Orléans, dava-se a entender que o livro trataria de D. Amélia, mas ninguém pensaria estar a comprar uma biografia da rainha.
Uma ninharia, dirão. Não é. O editor está a atrair o público com um engano literário. E o engano é duplo. Está oferecendo uma coisa que não é o que a capa e o título prometem, e leva o leitor menos conhecedor a pensar que uma biografia se escreve em forma de romance histórico. Tudo vale para vender livros? Assim é, pelos vistos.

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Escrever a um autor.

>> terça-feira, 27 de abril de 2010

Vou escrever a Ludger Saffranski para lhe agradecer o seu livro que ouvi em disco, lido por ele, sobre a amizade entre Goethe e Schiller, os dois grandes poetas alemães. O livro teve críticas magníficas, e o autor provavelmente cartas em abundância, pouco lhe pode interessar mais uma carta. Não impede que lhe escreva. Por mim, porque lhe quero dizer o prazer enorme que me deu com o seu livro.
Não é a primeira vez que escrevo a um autor, mas é a primeira vez que me pergunto, o que me leva a escrever. A perfeição? Não só, porque li muitos livros que admirei pela perfeição de estilo e interesse de assunto, e não escrevi aos autores. Olhando para trás vejo que, quando escrevi, foi porque se conjugavam vários factores. No caso deste livro sobre a amizade dos dois poetas, ele não só me satisfez plenamente, como veio quando pensava que já não me seria dada essa sensação de prazer e satisfação num livro novo. Veio no momento exacto, e talvez seja por isso que sinto vontade de escrever ao autor. Talvez não seja só a excelência da obra, a sua qualidade, mas também o momento em que ela é lida, que façam da leitura um momento tão especial, que o queiramos comunicar a outra pessoa, e de preferência a quem nos proporcionou esse momento.
. Lembro-me de outra ocasião em que escrevi ao autor, e concluo agora que o fiz pelo facto do livro dele ter vindo tão a propósito. Acabara de ler dois livros sobre a guerra franco-alemã de 1870. Um, alemão, de Theodor Fontane. outro, francês, um romance, mas considerado de grande exactidão histórica, lA Débacle’de Zola. Tive vontade de ter ainda uma outra opinião. Li ‘The Franco Prussian War’ de Geoffrey Wawro . O livro provou ser tão exactamente aquilo que eu procurava, no equilibrio da avaliação dos acontecimentos políticos e das acções militares, que peguei na pena e escrevi ao autor.

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>> terça-feira, 20 de abril de 2010

As fontes em Zurara
A consulta das fontes, indispensável como é, não deixar de ter os seus perigos. Um pequeno documento pode deitar abaixo uma conclusão laboriosamente alcançada. Um texto até ali desconhecido, pode iluminar de forma pouco lisogeira um feito glorioso do passado e até ofuscar a fama dos seus heróicos protagonistas. Que fazer nesses casos? Esquecer o documento incómodo para a nossa conclusão? Manter a conclusão, e esperar que ela se aguente sobre as suas fracas pernas? E o que fazer com texto que, pelo que nele se afirma, vai modificar um ponto histórico consagrado? E se o referido texto contém juntamente com dados indesejáveis, dados positivos, desejáveis?
Recorde-se a esse respeito o caso da ‘Crónica da conquista da Guiné’ de Zurara. O texto foi descoberto em Paris, em 1837, entre os manuscritos da Bibliothèque Nationale. Ferdinand Denis, o homem que fez a descoberta, revelou a existência da obra ao ministro de Portugal, este, por sua vez, transmitiu-o ao visconde de Santarém, e este, entusiasmado, iria promover a publicação do texto com um prefácio seu. A obra viera no momento certo, pois que, com ela, se provava que tinham sido os portugueses a explorar pela primeira vez a costa da Guiné, e não os franceses, como estes pretendiam.
Ora esta conclusão baseava-se em provas indisputáveis. Que eram os relatos de viagem, , que os homens que a realizado, tinham ditado para o infante D. Henrique. D. Afonso V, que encomendara a obra a Zurara, sugerira que ele consultasse para ela os referidos relatos. Zurara fez mais, publicou os ditos relatos. Não os interpretou à sua maneira, deu-os na sua forma original. Com o resultado que não há crónica tão pouco ‘crónica’ como esta. Não é o relato dos feitos de armas de cavaleiros de grandes nomes. Creio que, a não ser o Infante não há fidalgo mencionado. É um livro de aventuras, vividas e narradas por homens simples, por gente do mar.
Não eram explorações científicas aquelas ao longo da costa da Guiné. O Infante queria saber como aquilo era, como era a gente, que rios desaguavam, que enseadas havia. Pois bem, os donos de boas embarcações de pesca, que conheciam bem a costa, estavam prontos a ver aquilo melhor, a ir até um pouco mais longe. A coisa era proveitosa, o Infante contribuía, e a venda dos negros que se capturassem era um óptimo negócio. Mesmo dando ao Infante a sua parte. Tudo muito natural, não chocando ninguém.
Nos séculos XIX e XX é que já havia outras ideias quanto a compra e venda de escravos, e aliar a figura do grande Infante a esse negócio não apetecia. A crónica de Zurara, muito bem vinda como fonte, pela qual se provava a primazia portuguesa na exploração da costa oeste africana, era também uma fonte, , para reconstituir a figura de D.Henrique. Mas uma fonte que se teria gostosamente dispensado. A crónica continha também a descrição do aspecto físico do Infante. Zurara conhecera-o bem, aliás, ele ainda era vivo quando o cronista iniciou a sua escrita. O príncipe era um homem alto e forte, de largos ombros, tês clara, queimada do sol e cabelo levantado. Um retrato convincente. Sucedia, porém, que junto do texto de Zurara se via uma miniatura de um homem que tinha uma divisa igual à do Infante, ou muito parecida, e esse homem, de pele escura, ombros estreitos e cabelo preto penteado para a testa, não se parecia em nada com a descrição de Zurara. Os primeiros investigadores decerto o notaram, mas não deram grande importância ao caso. Toda a gente gostava de ter um retrato visual do Infante. E, depois, quem é que iria ler aquilo? Optou-se por ignorar uma informação histórica de fonte insuspeita. Historiadores agiram como crianças que esperam “que não se dê por isso”.
A crónica de Zurara exemplifica como provas históricas se podem, aproveitar de várias maneiras.
Observação à margem
Devem ser poucos os que leram esta crónica. E não é leitura que se recomende a leitores de história, que a querem como eles acham que ela devia ser, ou ter sido. Para os que aceitam a história como ela foi, mesmo que por vezes deplorando que assim fosse, para esses, a leitura das aventuras daqueles geógrafos improvisados é bem interessante.

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Ir às fontes

>> terça-feira, 13 de abril de 2010

Quando me meti a escrever história, descobri uma coisa inesperada. Descobri que a leitura dos documentos, nos quais me iria basear para escrever o livro planeado, que essa leitura era para mim um constante divertimento. É verdade, que, para os livros históricos que escrevi, consultei em geral documentos escritos à mão, e que, talvez por isso, visse sempre a mão do homem por detrás de pergaminho ou papel. Senti-me sempre próximo do feito que se registava no documento. Tanto quando, para a biografia de um militar e diplomata da Restauração, lia cartas, comunicados, actas de reuniões, missivas diplomáticas do século XVII, como quando, anos depois, li os pergaminhos dos séculos XIII e XIV, e, mais recentemente, li as cartas e missivas. E até as contas dos capitães do século XVI.
O documento medieval é particularmente vivo. O notário acompanhava o feito in loco. Quando no século XIV, a abadessa do mosteiro de Lorvão vai em pessoa tomar posse pelo seu mosteiro de uma almoínha, da qual o rendeiro não entregava a renda, o notário estava presente e anotou devidamente que dona abadessa pegara em terra e partira ramo de planta e galho de árvore, em prova de que aquela terra era sua, de seu mosteiro. E quando duas monjas do mesmo mosteiro vão a uma terra, que o mosteiro o mosteiro sabia ser sua, e o prior do Crato afirmava que era do seu priorado, pois lá estava o notário e anotando como as monjas tinham varrido o trigo no terreiro, e como um delas se sentara em cima dos fardos para demonstrar que aquele trigo era do mosteiro. E quando as freiras de Chelas contratam um caminheiro para levar a Roma as queixas que tinham do bispo de Lisboa lá estava o seu notário para redigir o contrato, e anotar como tudo se passara. A saber : que o contrato fora feito no cais do Furadouro, dali, onde ancoravam as naus de Flandres, e que o mensageiro recebera a missiva que devia entregar e o dinheiro para a viagem, e que pegara no bordão e se pusera logo a a andar, como ´homem caminhante.´ Com o que ficava bem testemunhado que ele fora pago e que aceitara o encargo.
Os documentos valem por aquilo que o pesquisador neles sabe ler. Naquele caso, estava a escrever sobre a vida da monja medieval portuguesa, centrando-me sobretudo na história de Santa Maria de Lorvão, o documento de Chelas fez com que procurasse saber o que se fazia em Lorvão quando as monjas mandavam recados para fora do reino. Não encontrei contratos celebrados com caminheiros. Do que presumi, que Lorvão enviava a essas missões alguém que estava ao seu serviço para o efeito.
Outra pessoa, que lesse o mesmo documento, tiraria dele outra informação, faria a partir dele outro raciocínio. Mas tínhamos ido à mesma fonte.
Os historiadores do século XIX descobriram que para escrever história do passado, havia que consultar os documentos originais desse passado, que havia que ir às ‘fontes’. Ignoro quem cunhou a expressão, mas dificilmente se encontraria melhor forma de designar a consulta documental para um livro de história. Há que ir às fontes.

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>> quarta-feira, 7 de abril de 2010

Bibliografia
Não sei quando se iniciou, se tornou hábito e, por fim, obrigatório, citar no fim de um livro de história, as obras que se haviam consultado. Hoje a coisa existe, e não se concebe como possa não ter existido.
Creio ter escrito uma vez, que, por princípio, não procurava orientação alheia para a minha escrita. É verdade. Mal ou bem, preferi sempre a independência. Teimosamente só, livre de idear à minha maneira.
Em matéria de bibliografia e de fontes as coisas foram ligeiramente diferentes. Não senti a necessidade de consulta, mas aceitei com gratidão as sugestões que me fizessem. A uma dessas sugestões devo a explicação de um problema e a visão totalmente nova de certo aspecto do assunto do livro que planeava.
Estava na livraria Histórica Ultramarina, e em conversa com José Maria Almarjão, contei-lhe que pensava escrever sobre a vida das monjas medievais em Portugal, e que em português pouco encontrava sobre o assunto. O Dr. Berckmaier colaborador alemão do livreiro, entrou naquele momento, ouviu o que eu disse, pegou num papel, escreveu qualquer coisa, estendeu-me o papel, e disse: -leia este livro. Li o livro. Era em alemão e tratava de movimentos religiosos femininos na Idade Média. A leitura abriu-me os olhos. Percebi como se explicava que, no século XIII, tantos mosteiros de homens tivessem passado a ser mosteiros de mulheres. A transformação do grande mosteiro de monges de Santa Maria de Lorvão em mosteiro de mulheres, , conseguida não sem luta, note-se, explicava-se. Explicava-se a instalação de celas de mulheres religiosas em Alenquer.
As filhas de D. Sancho I, D. Joana, apoiando as mulheres francas de Alenquer que queriam viver a vida religiosa em celas individuais, D.Teresa, que instalou monjas em Lorvão, D. Mafalda, que tomou conta de Arouca, foram, quase com certeza, adeptas do papei activo da mulher em matéria de religião, e representantes em Portugal do feminismo religioso, que se espalhara pela Europa.
O primeiro capítulo daquele meu livro (ainda por publicar) foi escrito tendo em conta as novas perspectivas que um livro aconselhado por um conhecedor, me tinham aberto.
Independente na escrita, sim, mas em matéria de bibliografia e de fontes aberta a todas as sugestões.

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Antes de escrever História

>> terça-feira, 30 de março de 2010

Há dias perguntaram-me como se poderia consultar certo arquivo particular e consultar documentos que interessavam a um trabalho de mestrado. Realizei uma vez mais a que ponto eu fora privilegiada por ter podido consultar livremente o arquivo onde tinha as fontes de que necessitava para o trabalho que pretendia realizar. Não q eu com isso se esgotasse a pesquisa documental, mas tinha o principal. Para o que faltava teria as facilidades que me permitiam a bolsa de estúdio da Gulbenkian que me fora concedida. Como não admirar profundamente e respeitar aqueles que se abalançam a trabalhos de grande fôlego sem gozarem das facilidades que eu então tive. Não sei como o fazem. Sinto por eles a frustração de não poder ler o livro necessário, de lhes ser difícil ou impossível consultar as fontes.
O trabalho preliminar para um livro histórico – e é disso que se trata - é apaixonante. Não sei como exprimir a satisfação que nos dá aquela gradual abordagem ao tema que nos ocupa.
Procurar as obras que pensamos necessários é a parte mais fácil desse trabalho preliminar. De um primeiro livro passa-se para outro e deste para outro, é uma cadeia.
Os autores destes livros basearam-se em documentos, tiraram delas as suas conclusões. Ansiamos por consultar esses documentos. E outros. Para tirarmos as nossas próprias conclusões. Porque todo o historiador, do grande ao mais modesto, escreve o seu livro para mostrar “como na verdade era”, e não duvida que o conseguirá melhor que qualquer outro.
As fontes. Dificilmente se encontraria expressão mais adequada para designar os documentos nos quais se baseia o livro de história, e a sua pesquisa é o momento mais apaixonante da sua feitura.
Bibliografia lida e fontes consultadas, é o momento de começar a obra. E então, como diz uma figura de ‘Alice no país das maravilhas’ a outra: “ é só começar no princípio e acabar quando chegar ao fim”.
Apetece-me escrever sobre esses fundamentos da escrita de história que são a consulta da bibliografia e o estudo das fontes. Fica para outra vez.

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Porquê tão tarde?

>> terça-feira, 23 de março de 2010

Há pouco publiquei um romance histórico que tem como assunto principal a condenação e morte - em 1483 – do duque de Bragança. A uma das figuras fictícias do livro faço corresponder com um amigo em Flandres. O homem conta e comentam suas cartas o que se está passando em Lisboa, e, como ambos são grandes leitores, ele fala ao amigo na esperança de brevemente haver também em Portugal a nova arte de imprimi. O assunto não afecta em nada o tema principal, inclui-o unicamente para dar “o ar do tempo”. Só agora, passados alguns meses sobre a conclusão do livro, é que realizei a que ponto era insólito o facto de em 1483 não haver impressores em Portugal. É verdade que se trata de um romance histórico não de um livro de história, mas a coisa é suficientemente curiosa, e mesmo no romance devia ter sido notada como tal.
O interesse que a arte da impressão de imediato suscitou, fez com que em muito poucos anos houvesse impressores nas principais cidades da Europa.. É muito notado que em Inglaterra a arte só tivesse dado entrada em 1476. Em Veneza, Aldo Manucio imprimia pouco depois os clássicos gregos no original.
A livraria do Museu Britânico em Londres, que possui a maior colecção de incunábulos do mundo, tem 28.000 títulos de incunábulos no seu catálogo. Pois em Portugal só em 1495 há um grande impressor em Lisboa, Quarenta e nove anos depois da invenção da nova arte.
E o espantoso é que, isso não seja frisado ou notado. Nem mesmo um bibliófilo como D.Manuel II se lembra do facto. Nem uma palavra a esse respeito quando fala do seu “Vita Christi”. Ora o livro ter sido publicado em Portugal, e ser uma obra magnífica da arte de impressão, é sem dúvida muito interessante. Mas saber porque é que só nesse ano se imprimiu em Portugal é muito mais interessante.

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ANOTAR.

>> terça-feira, 16 de março de 2010

Quando um dia, no muito longínquo passado, nas margens do rio Tigris, ou talvez do Eufrates, alguém pegou num pedaço de barro húmido e riscou nele três riscos verticais e os cruzou com risco horizontal, ele estava a “anotar”. A sua memória já não seria já o que fora, e precisava de recordar que já fora pago de três ovelhas que vendera. Ou talvez que comprara. Anotou-o. Pôs o pedaço de barro ao sol, e adormeceu tranquilo à sombra da palmeira.
O tempo passou, as coisas evoluíram, já não anotamos em bocados de barro. Agora anotamos em elegantes livros de notas, que nos oferecem, ou, mais vulgarmente, nas costas de sobrescritos ou outros pedaços de papel. Eu sou uma grande anotadora. Sucede que nem sempre consigo decifrar o que anotei. No caso que me ocupa isso não sucede. Não tenho dúvida que “ 3 Jli.G.!!!” quer
dizer que emprestei três livros ao meu irmão G, e que preciso de lhe lembrar esse facto.
Livro emprestado não volta a casa sem ser lembrado. Até aí tudo bem. Só que as coisas mudaram depois da nota. Agora vou pedir a devolução de livros que não vou poder ler. Para quê então querê-los de volta? Não se trata de obras de valor, e, a avaliar pelo tempo que G as conservou, o meu irmão deve gostar delas. E eu não as vou ler. Pois é. Não as vou ler, mas elas vão estar nas minhas estantes, e ao pegar nelas vou saber o que lá está escrito. Agora é assim que leio. E o que dizer daqueles espaços nas estantes que clamam por serem preenchidos? Não há que hesitar. Com as devidas atenções para não o ofender – “ eu já devia saber que ele não precisava de ser lembrado” - mansamente, mas teimosamente, vou obedecer à nota: :”3 li.G !!!!” . Se o anotei foi porque a coisa era para ser lembrada.
E os livros não só se lêem, pegamos neles, folheamos, alguma palavra conseguiremos ler, e as capas. Que bonitas capas, e as lembranças, “é verdade a este comprei ali, a este em Paris e julguei comprar uma pechincha quando afinal lhe faltavam páginas. Já o devia ter despachado. Mas para onde? Enganando outro? Não é o meu género. Furiosa, contemplo-o. A “Guerra e a Paz” de Tolstoi numa edição linda, e tão barata. Só que lhe faltam páginas. Não o vou ler. Mas vou-me lembrar. E de resto: há a obra em audi- livro. Já anotei.

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Vamos a ver

>> terça-feira, 9 de março de 2010

Vamos a ver se consigo retomar a escrita do meu blogue. Já tenho o necessário instrumento: um computador com um programa para o meu caso de pouca visão de perto.
Passar para Windows, que tem esse programa, não é fácil para quem estava habituada ao Mac. Até por vezes desesperante. Pergunta: porquê então insistir? O meu blogue não é tão importante, que se dê pela falta dele. Assim é. Mas a verdade é que eu preciso de escrever. No meu particular caso, a escrita é uma das formas que descobri para compensar a leitura de livros. A esses só os que têm uma letra bem preta sobre papel bem branco é que, com ajuda de lupa, consigo ler .Mas as letras que vou formando ou que vou imprimindo, essas estão à medida da minha visão. Ao escrever, leio. E ai está! Vou publicar textos no meu blogue para ler.
Encontrei ainda outras formas de leitura. A memória. Sempre gostei de reler um livro que tinha apreciado. Agora estou a colher o fruto dessas releituras. Pego num livro, ou chamo-o à memória, e, como por encanto, lembro-me de frases, de passagens, que me trazem o livro de volta.
A audição. Sabia que existiam livros lidos, audi-books em inglês, mas nunca me interessaram. Fiz mal. Ouvir ler é um prazer e não falta escolha. Em duas.
Em português a escolha não é grande. Em alemão e inglês há de tudo. Desde os clássicos antigos aos modernos, desde a boa ficção recente, livros de humor, de poesia. Ensaios, história, filosofia, a escolha não acaba.
Em resumo: não leio da mesma forma, mas leio, e então porque não continuar com o blogue? É o que vou fazer. Porém não como de costume
às segundas mas antes às terças-feiras, dia em que tenho uma ajuda ainda muito necessária.
Até à próxima terça feira.

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Tem de ser

>> segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Chegou o momento de encara as coisas de frente. Tenho muita dificuldade em emendar os meus textos. perco tempo e acabo por fazer um texto mal feito. A solução seria acabar com o blogue, mas habituei-me a ele, tenho pena de o deixar. Além de que me dizem que a Mac tem um modelo ou programaque ajudará a quem está no ei caso. Não tenho hrande fé, mas veremos. Entretanto deixo o blogue em aberto e de vez em quando escrevo um pequemo texto, transcrevo alguma coisa de livro que tenha no compitador. A culps ´é do ratinho e do cursor que não querem nada comigo.

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Auti-critica

>> terça-feira, 5 de janeiro de 2010

«
Isto de escrever sobre a nossa própria escrita depressa farta. Mas como não gosto de deixar as coisas a meio, vou acabar o que tão levianamente comecei.
Lembro-me ter escrito num texto anterior, que não pedia a opinião de ninguém sobre o que estava escrevendo. É verdade, mas houve uma excepção. Como todo o autor que se presa, também eu escrevi uma peça de teatro, e como tinha as minhas duvidas quanto à qualidade da obra, dei-a a ler ao Luís Stau Monteiro. Que foi franco: “o dialogo é muito bom, mas o enredo não tem interesse nenhum”. Aceitei a critica, rasguei a peça. É verdade que teria preferido a aprovação, mas não teria querido palavras lisonjeiras que me teriam iludido acerca das minhas capacidades. E sempre depois disso, quando pelos anos fora me veio a tentação de escrever a peça que arrebataria o público, sempre parei a tempo, porque me lembrei que o bom dialogo só por si não faz uma boa peça de teatro.
Foi uma critica construtiva, salutar, a do Luís Stau Monteiro, e em consequência dela passei a
ser rigorosa na auto-critica. . Penso que todo o escritor, seja ele grande ou pequeno, tem a sua opinião sobre a qualidade da sua escrita, e sobre aquilo para que está mais ou menos dotado. Parece-me que os meus livros têm personagens que se fixam, que os diálogos são naturais e as histórias têm algum interesse. Mas não são grandes histórias. Para isso seria preciso que eu fosse uma grande prosadora. O que não sou. Conheço os meus limites. O romance épico de mil páginas não é para mim, e o pequeno conto exige um talento muito especial que não tenho. Não me abalançaria a um romance policial, mas já ideei um crime e a sua solução e foi um desafio que me divertiu, e que não me importava de repetir. Nunca escrevi um livro para crianças, e é tarde para tentar a experiência. Do teatro desisti. Resta-me a conclusão que sou unicamente , uma contadora de histórias que escreve razoavelmente bem, mas não uma prosadora. “Escrita” é uma coisa,“prosa” é outra. São os grandes prosadores que escrevem os grandes livros, os grandes romances, os grandes ensaios. Já para escrever história, a boa escrita é – parece-me – preferível à grande prosa. Li de uma assentada (e mais do que uma vez) “L`Histoire des Girondins” de Lamartine, mas tive sempre a consciência que estava a ler uma grande obra de prosa e não a História dos deputados da Gironde. Mas não é de escrever historia que quero aqui falar. Isso é um capítulo à parte.
As vendas dos meus livros não atingem cifras astronómicas. Cada um deles teve entre 1500 e 2000 leitores. Como o número não varia muito, isso permite-me pensar que sejam sempre – mais ou menos - os mesmos leitores. Ou seja, que há por esse Portugal fora entre mil e quinhentas e duas mil simpáticas almas, que gostam dos meus livros. Não é que não achasse óptimo que fossem mais, mas consolo-me com a ideia que são poucos mas bons. E muito entendidos , já se vê. E, pensando bem, considerando que a minha visibilidade pública é nula, ter dois mil leitores não é nada mau.
Durante séculos, a visibilidade publica do autor não influenciava grandemente a sua carreira literária. O escritor ia-se revelando pouco a pouco. Nascia, crescia, aparecia. Agora sucede que o escritor já tenha aparecido antes de nascer. E esse neófito conhecido pode contar de imediato com uns milhares de leitores, entre curiosos, simpatizantes e interessados. É mesmo provável que em pouco tempo possa cantar, como Schiller na sua Ode à Alegria: “Abraço-vos, milhões”.
Pergunto-me por vezes se esses escritores é reconhecem que é em parte à sua visibilidade física que devem parte do seu sucesso intelectual.
Não podemos criticar ou menosprezar os autores mediáticos por se servirem do escadote da sua popularidade, mas lá que este novo género de autores confunde a cena literária, lá isso confunde.

Observações à margem
Agora que qualquer um de nós corre o risco de ser confrontado por um microfone e convidado a se pronunciar sobre os mais variados assutos, é bom saber que, para nos ajudar a ser fluentes, se usa agora muito a expressão “significativamente”. Aiém do nosso conhecido “digamos” e do muito útil “ no sentido de”.
Assim, se tiver de dizer, que o ministro da agricultura foi a Penedos ver os estragos causados pelas chuvas, poderá, com toda a vantagem, dizer: “o senhor ministro da agricultura deslocou-se a Penedos, no sentido de, digamos, verificar, se os danos causados pelas chuvas eram, digamos, significativos”.
Ps O ATRAZO FOI INVOLUNTÁRIO

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Sobre este blogue

Libri.librorum pretende ser um blogue de leitura e de escrita, de leitores e escritores. Um blogue de temas literários, não de crítica literaria. De uma leitora e escritora

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